Reflorilha aposta em empreendedorismo sustentável na Ilha do Ferro

Parceria com Sebrae visa recuperar bioma da caatinga e fomentar a economia do povoado sertanejo.
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Parece estar mais que comprovado que o padrão da nossa coexistência com o meio ambiente não tem dado certo nem para nós, e nem para a natureza. São tantos acidentes e catástrofes acontecendo neste momento em todo o globo que se tornou urgente modelar negócios que diminuam os impactos de nossos consumos dos recursos naturais do planeta.

Uma boa referência de modelo de negócio que une lucro e sustentabilidade está na Ilha do Ferro, na cidade de Pão de Açúcar, Sertão do estado. O lugar foi escolhido como protótipo de um empreendimento ambiental ousado e que envolve desde a recuperação do bioma da caatinga, a execução de políticas públicas para melhorias estruturais até a promoção da economia criativa e do turismo.

No início desse ano, artesãos formalizaram a Associação de Artesanato em Madeira da Ilha do Ferro – Ilha das Artes. Com 37 membros atualmente, sendo boa parte já pertencente a terceira geração de escultores do povoado, o grupo se uniu para pôr em prática o Programa Reflorilha, que prevê ações que incluem a coleta seletiva de resíduos, a instalação de um viveiro com espécies nativas, melhoria do tratamento da água, sistema de saneamento básico, a criação do Conselho de Desenvolvimento Sustentável e de um centro de informações turísticas, apoio as iniciativas de Educação Ambiental e a elaboração de um sistema de pagamentos por serviços ambientais e absorção de carbono integral.

A ideia vinha sendo maturada junto a uma equipe do Sebrae Alagoas há pelo menos dois anos e agora, depois de escutas, consultas, formalização de parcerias estratégicas e outras várias etapas começa a sair do papel. O processo foi lento, encontrou resistência, causou desconforto, mas a urgência ambiental em razão da escassez da matéria prima tão rara e peculiar falou mais alto e levou a comunidade a aceitar que os problemas já estavam batendo a porta e que era preciso união e ações imediatas.

“Todo território que conta com matéria prima natural como fonte de geração de produtos e renda em algum momento vai ter que trabalhar para repor a retirada desses insumos”, enfatiza a analista e gestora de Artesanato do Sebrae Alagoas, Marina Gatto. Como uma das agentes na elaboração do Programa, a analista aponta que o crescimento do número de artesãos e a escassez de madeira após quase um século de retirada das árvores sem reposição de espécies nativas como o mulungu, pereiro, umburana de cheiro, umburana de cambão, craibeira e braúna foram alguns dos pontos cruciais que ligaram o alerta do risco iminente que poderia quebrar o modelo de negócio tão bem-sucedido da Ilha.

Para contribuir com o sucesso do empreendimento, foram agregadas ao projeto a Prefeitura de Pão de Açúcar, a Universidade Federal de Alagoas, a Secretaria do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, o Instituto do Meio Ambiente, a Chesf, e outros parceiros, inclusive proprietários de áreas na região, que seguem somando forças no Programa.

Ocupação do território é mais um desafio no percurso

A Ilha do Ferro é um exemplo de ponto fora da curva como sendo um lugar em que as pessoas ganham a vida vendendo arte. Não bastasse isso, a região está margeada pelas águas do São Francisco, ajudando a proporcionar uma experiência turística que une cultura e contato com a natureza. Por possuir características tão singulares a comunidade acabou atraindo pessoas de alto padrão financeiro e poder aquisitivo, que compraram praticamente todas as áreas disponíveis do povoado. O processo de ocupação urbana da Ilha tem sido mais um dos desafios para recomposição do bioma do território.

“Uma vez que a área foi completamente vendida, os espaços existentes para plantar as árvores são privados, o que tem demandado ações de sensibilização junto aos proprietários dessas terras, para que eles contribuam tanto na recuperação do meio ambiente quanto na perpetuação das artes entre as gerações de artesãos”, explica a analista do Sebrae Alagoas e uma das gestoras do Programa Reflorilha, Ana Madalena Sandes.

A gestora defende que é preciso investir fortemente em um empreendedorismo que seja transformador para o empreendedor e seu meio ambiente. “Trata-se de uma mudança de modelo mental na forma de fazer um negócio sustentável e rentável, uma vez que vamos ser cobrados sobre pautas que tratam da nossa permanência no mundo. Estamos vivendo uma situação urgente e temos que trabalhar para a reversão das crises climáticas, pois recursos naturais são finitos e podem sim, ser extintos”, completou.

Programa já vem dando resultados

Como membros da Associação que encabeçaram o empreendedorismo ambiental na Ilha, Yang da Paz e o pai, Petrônio, além de já terem plantadas as mudas em seus terrenos particulares, as ações do grupo de associados já realizaram o plantio de centenas de mudas em áreas privadas. Com a aproximação do inverno, o grupo se prepara para um terceiro movimento de plantio, inclusive para celebrar o dia do meio ambiente.

Juntos, pai e filho estão contribuindo para o surgimento e o fortalecimento de novos artesãos não só da comunidade, mas de outras cidades do entorno do rio São Francisco com grande potencial para integrar o mercado das artes populares.

Yang é educador e presidente da Associação Ilha das Artes. Ele mapeia e incentiva o desenvolvimento do potencial dos escultores da Ilha, além de circular pelos municípios do entorno do rio São Francisco procurando, preparando e formando novos artesãos.

“O município de Olho d’ Água do Casado é um exemplo de local que possui um grande potencial de negócios para a arte popular, considerando que a cidade está na rota dos passeios pelos cânions do São Francisco, com uma presença boa de turistas de várias partes do Brasil e do mundo. Embora tenha esse cenário, não há artesãos oferecendo seus produtos, gerando renda e movimentando esse mercado na região”, explica Yang, que junto a Nikiela e Geferson, artistas da Ilha, já promoveram oficinas na região.

Além de ser um empreendedor ambiental, Yang também faz parte do grupo de jovens empreendedores por propósito e ativista de boas causas. Seu foco é preservar a natureza e o ofício das artes com a formação de novas gerações de artesãos. Ele vive do seu trabalho desde os 13 anos, tendo as esculturas como a principal fonte de renda da família, que até chegar à Ilha do Ferro, era carente e vivia da agricultura. Hoje, aos 27 anos, ele remunera os mais jovens para que eles possam se dedicar a aprender a profissão.

“Quando meu pai conheceu o Fernando, um dos primeiros artesãos da Ilha, foi desafiado por ele a fazer uma escultura. Naquela época, uma pessoa trabalhava na roça o dia todo para ganhar diária de R$10. Meu pai fez sua primeira escultura em 2 horas e a vendeu pelos mesmos R$10. A partir desse momento a arte entrou nas nossas vidas como o principal meio de renda. Ela os proporciona oportunidades que vão além de ganhos financeiros”.

Bem-posicionados no mercado da arte popular e do artesanato, todos os escultores e as bordadeiras da comunidade sertaneja fabricam peças de arte, móveis e utensílios e vendem em casa, nas feiras nacionais e galerias, com peças que são retratadas mundo afora e aclamadas pela estética peculiar dos moradores da comunidade.

Para obter uma escultura do Yang é preciso entrar numa lista de espera, que tem mais de uma centena de obras encomendadas atualmente. O exemplo dele é também o da maioria dos artesãos, cujas peças vendidas saem semanalmente transportadas em carretas Brasil afora. Embora saiba que tem potencial para produzir e vender mais, o jovem entende que é essencial ser respeitoso com a natureza não utilizando madeira verde.

“Produzimos e plantamos mudas para reflorestar a região porque estamos enfrentando a escassez de madeira. Por isso o Programa Reflorilha é tão necessário, porque é 100% sustentável e em 10 anos estará nos dando retorno com a recuperação do bioma e o fornecimento de matéria prima sem qualquer impacto negativo no ecossistema”.

Todo negócio nasce para resolver um problema

Todo negócio precisa ter foco na sustentabilidade, se quisermos garantir a saúde do planeta. Mesmo que esse empreendimento não tenha relação direta com extração de matéria prima natural como fonte de produção de insumos, é preciso que empresas, independentemente de seu tamanho e porte, adote os conceitos Ambiental, Social e Governança Corporativa, conhecida como ASG. A sigla ganhou importância na estratégia de diversas empresas ao redor do mundo e representa a integração de práticas mais responsáveis nas organizações

“Adotar esse modelo diminui o risco de falência dos negócios, inclusive. Qualquer empresa pode e deve apoiar iniciativas que trabalhem na compensação dos danos causados pelos impactos diretos e indiretos sobre o meio ambiente, alternativas são muitas e o Sebrae está debruçado sobre todas elas”, destaca Ana Madalena Sandes.

Fotos: Waldson Costa – Ascom Sebrae/divulgação

 

 

 

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